Review: Blade Runner 2049 (2017)
Por Fernando Booyou Blade Runner 2049 recria com maestria tudo o que agradou aos fãs. Extremo respeito ao original, mas sem momentos “como lágrimas na chuva”. Talvez um dos […]
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Por Fernando Booyou Blade Runner 2049 recria com maestria tudo o que agradou aos fãs. Extremo respeito ao original, mas sem momentos “como lágrimas na chuva”. Talvez um dos […]
Por Fernando Booyou
Blade Runner 2049 recria com maestria tudo o que agradou aos fãs. Extremo respeito ao original, mas sem momentos “como lágrimas na chuva”.
Talvez um dos maiores debates se é “bolacha ou biscoito” da história do cinema tenha chegado ao fim sem ninguém se dar conta. Afinal, Rick Deckard (Harrison Ford) é humano ou Replicante? Blade Runner 2049 não se propõe em responder essa dúvida. Pelo contrário, ainda dá uma revivida ao debate. Mas, sem querer, pode ter trazido a resposta. E este nem é o maior mérito do filme.
Quem assiste hoje, percebe que Blade Runner de 1982, que se passa no futuro “distante” de 2019, nunca esteve tão atual. Ainda não temos carros que voam transitando pelas ruas e nem escravos sintéticos em outros planetas. Mas 35 anos após o lançamento, a obra continua “intocável” (entre aspas mesmo) e bem próxima da realidade atual. Blade Runner 2049 é o filho mais novo que respeita completamente o pai, seguindo os mesmos passos e mantendo toda estética, enredo e timming do seu antecessor. E justamente por isso também arrisca pouco. O diretor Denis Villeneuve (de A Chegada e Os Suspeitos) deixa evidente que fez bem o dever de casa e sabe recriar exatamente o que agradou aos fãs. A preocupação em modernizar os 30 anos decorridos dentro do enredo traz como resultado novos elementos, recursos, figurinos, arquiteturas que se comunicam perfeitamente com este universo futurista já estabelecido. Tudo feito para ser poluído, turvo, com pobreza e riqueza usufruindo de tecnologias, mostrando o quanto Ghost In The Shell não soube explorar sua fonte cyberpunk de inspiração. A trilha sonora, da parceria entre Hans Zimmer e Benjamin Wallfisch, é uma clara homenagem ao trabalho icônico de Vangelis, seguindo timbres, tons, sintetizadores e até referências indiretas e sutis, mas sem nenhuma composição tão emblemática quanto às trilhas de 82, que até hoje são relembradas.
No senso comum, o espectador tem a lembrança de que o primeiro se trata de um filme filosófico. Na verdade, toda filosofia presente está na interpretação do público acerca dos acontecimentos. O enredo mesmo não levanta questionamentos além das indagações presentes em uma investigação policial. Em 2049 não é diferente e até neste ponto reverencia sua matriz. Existe muito espaço para reflexões, mas todas de acordo com a sensibilidade de cada um em refletir sobre cada fala ou situação. Filmes como Matrix ou séries como Westworld deixam estes pensamentos mais em destaque. Essa coerência da continuação é fruto do roteiro conjunto de Michael Green (Logan e Alien: Covenant) com o roteirista do primeiro filme Hampton Fancher, o que manteve a fidelidade da obra, seguindo uma receita já testada e, consequentemente, sem grandes riscos de sair da zona de conforto. Uma tendência que tem sido muito explorada em reboots com cara de continuidade, como visto na saga Star Wars e em fracassos como Os Caças Fantasmas. Ao seguir parâmetros, o que temos é um excelente filme fiel e digno, mas sem a pretensão de superar o original.
No antecessor, a abordagem é o direito de viver de uma forma sintética consciente, que “naturalmente” evoluiu para ter sentimentos, sensações, anseios e todos as outras imperfeições que nos tornam perfeitos. No sucessor, vemos os desdobramentos dessa criação humana e com assuntos do cotidiano pincelados em momentos pontuais. O policial Blade Runner K (Ryan Gosling) sofre preconceitos que se comparam ao racismo nos dias de hoje. Ele é o foco central enquanto todos os outros personagens orbitam em torno dele, o que favorece o clima noir-investigativo. K tem uma relação “platônica” com um holograma Joi (Ana de Armas), uma inteligência artificial que ama incondicionalmente seu dono, como uma Siri com mais recursos, bem similar com os casos recentes de pessoas que se casam com personagens intangíveis (sim, isso realmente existe). Niander Wallace (Jared Leto) é um mega corporativista que acabou com a fome no mundo com lavouras artificiais e que, sob a bandeira de fazer benfeitorias, retomou a produção de Replicantes, escravos humanos sintéticos (não são realmente andróides) com mais inteligência, destreza e força que uma pessoa comum. Diferente dos modelos anteriores de sintéticos, estes não têm data de validade de apenas 4 anos. Porém, são concebidos sem o livre arbítrio e são obrigados a obedecer ordens, outro ponto deixado para reflexão do espectador.
Agora, levando tudo isso em consideração, voltamos ao ponto inicial. Será que Deckard era mesmo um Replicante? Na obra original de Philip K. Dick (Andróides Sonham com Ovelhas Elétricas?) ele é indubitavelmente humano. Na adaptação de roteiro feita por Hampton Fancher, ele assume que deixa essa dúvida propositalmente, embora acredite na humanidade do personagem. Já para o diretor Ridley Scott, que criou este universo no cinema, é óbvio que ele é um Replicante que não está ciente deste fato. Mas se levarmos em consideração que os sintéticos contemporâneos de Deckard só sobreviviam por 4 anos, como ele estaria presente na história 30 anos depois? Pode até ser que ele seja um “modelo” especial sem data de validade. Apesar de que em momento algum deixa claro este lado “especial” dele, mesmo o filme deixando abertura para a existência de sintéticos com características incomuns. Talvez, assunto para uma continuação, em um futuro não muito distante.
Nota 8,5 de 10.0
(para o fã que acha o original nota 10, a continuação é nota 9)